REFORMA TRIBUTÁRIA E CONTRATOS EMPRESARIAIS: DA GESTÃO DE RISCOS À SEGURANÇA JURÍDICA
No setor industrial, varejista ou de tecnologia, os contratos — em especial os de fornecimento — desempenham papel estratégico na estabilidade dos negócios e na garantia do cumprimento dos acordos estabelecidos. No contrato de fornecimento, o fornecedor assume o compromisso de entregar mercadorias ou serviços ao adquirente de forma contínua e periódica, observando condições previamente estipuladas, como prazos, quantidades, preços, formas de pagamento e responsabilidades.
A fixação do preço, por sua vez, não reflete apenas os custos diretamente relacionados à execução do negócio, mas também incorpora a carga tributária incidente sobre a operação, além de custos indiretos relevantes. Contudo, ao longo da execução e vigência contratual, é inevitável o surgimento de desafios que exigem ajustes de direitos, obrigações, preços e riscos, em decorrência de mudanças que naturalmente ocorrem ao longo do tempo. Essas variações impactam não apenas contratos pontuais, como os de compra e venda com entrega única, mas, sobretudo, contratos que regem relações comerciais duradouras e periódicas. Nesse contexto, enquadram-se os chamados contratos relacionais, entre os quais se destaca o contrato de fornecimento. Alterações decorrentes de flutuações de demanda, mudanças de preços, avanços tecnológicos, exigências ambientais ou alterações legislativas — como as advindas da Reforma Tributária — tornam essa discussão ainda mais necessária.
Tais mudanças afetam não apenas a rotina operacional, como a regularidade das entregas, mas também a própria manutenção de relações comerciais transparentes e eficientes. Diante desse cenário, mecanismos de resiliência contratual tornam-se indispensáveis, assegurando a continuidade das relações comerciais e a preservação do retorno econômico esperado pelas partes. Entre eles, sobressaem o reequilíbrio contratual e a renegociação.
Para o presente estudo, o foco recai especialmente sobre o reequilíbrio contratual
Com a proximidade da entrada em vigor dos novos tributos sobre bens e serviços, a revisão das cláusulas de recálculo de preços torna-se prioritária. Embora contratos entre particulares dependam da livre negociação, a adaptação às mudanças tributárias exige postura proativa das partes.
O período de transição da Reforma Tributária demanda uma gestão contratual dinâmica, orientada para o equilíbrio econômico-financeiro, afastando uma visão meramente mecanicista.
Diante dessa instabilidade temporária, recomenda-se a inclusão de cláusulas-padrão de reequilíbrio nos contratos em vigor, bem como a adoção de mecanismos preventivos, como auditorias periódicas e sistemas de monitoramento contínuo de custos, de modo a reduzir litígios e custos transacionais.
Não apenas contratos comerciais, mas também acordos de fusões e aquisições, reorganizações societárias, aquisições de empresas e estruturas de prestação de serviços devem ser revisados frente às alterações tributárias.
Na redação de novos contratos, recomenda-se priorizar a fixação do preço líquido, descontados os tributos, tendo em vista que a CBS e o IBS serão cobrados “por fora” e gerarão créditos tributários para as empresas, conforme a legislação vigente.
Operações de aquisição, em especial, serão diretamente afetadas, assim como políticas de descontos, bonificações e modalidades de contratação de pessoal.
As mudanças legislativas tendem a impactar significativamente a carga tributária suportada pelas empresas, repercutindo tanto em contratos privados quanto em contratos firmados com o poder público, influenciando custos, margens e capacidade de prestação de serviços ou fornecimento de bens. Essa realidade exige uma reavaliação prévia antes mesmo do início do período de transição. Em muitos casos, será necessário revisar cadeias de fornecedores, estratégias logísticas e estruturas societárias.
Além disso, eventuais limites legais ao reequilíbrio contratual devem ser cuidadosamente analisados.
Alterações em regras, taxas ou alíquotas demandam revisões precisas: nem todos os contratos precisarão ser modificados, mas caberá às partes comprovar o impacto econômico das mudanças por meio de cálculos técnicos, evidenciando eventual desequilíbrio decorrente da nova legislação.
Elaborar justificativas robustas com documentação precisa será um desafio para muitos agentes econômicos.
À semelhança dos contratos administrativos, recomenda-se que tais estudos incluam:
- Cálculos detalhados comparando a situação anterior e posterior às alterações legislativas.
- Documentação fiscal que comprove a nova carga tributária.
- Justificativas técnicas e financeiras que demonstrem os impactos diretos no contrato.
- Documentos complementares ou laudos periciais que reforcem a argumentação.
Enquanto não houver regulamentação definitiva da Reforma Tributária, é prudente que os contratos contenham mecanismos automáticos de ajuste, reduzindo potenciais litígios futuros.
Nesse contexto, torna-se imprescindível realizar análises de risco detalhadas desde a negociação inicial, promovendo diluição de riscos e maior previsibilidade.
Todos os contratos devem ser revisados, inclusive os mais comuns, como os de locação, infraestrutura ou aquisição de energia. Os contratos de fornecimento, no entanto, merecem atenção redobrada, devido à sua natureza contínua e à dependência dos preços pactuados para sua manutenção.
Além de cláusulas sobre preço e pagamento, devem constar disposições acerca de arbitragem, penalidades por descumprimento tributário, rescisão motivada por infrações reiteradas e outros mecanismos de governança contratual.
A formalização de cláusulas bem estruturadas assegura segurança jurídica e eficácia na relação entre as partes, prevenindo conflitos futuros.
Portanto, recomenda-se que os contratos atuais já contemplem cláusulas elaboradas com cautela, aptas a viabilizar o reequilíbrio diante de mudanças tributárias ainda em fase de regulamentação.
Empresas que adotarem postura preventiva, investindo em due diligence contratual e planos de contingência tributária, estarão mais bem posicionadas para evitar litígios.