Alterações na Lei de Recuperações Judiciais, Extrajudiciais e Falências pela Lei nº 14.112/2020
Foi sancionada, em 24/12/2020, a Lei nº 14.112/2020, oriunda do Projeto de Lei (PL) nº 4458/2020, de relatoria do Senador Rodrigo Pacheco, que reformula a Lei nº 11.101/2005 (Lei de Recuperação Judicial e Falência).
Como principal inovação, a Lei retira formalidades entendidas como desnecessárias e busca incentivar o uso dos meios eletrônicos para agilizar o trâmite processual que deverá se dar em 6 meses, sendo que atualmente leva em média de 2 a 7 anos.
Dentre as principais inovações temos:
(i) a possibilidade de adesão prévia dos credores interessados, substituindo a necessidade de realização de uma assembleia geral;
(ii) a possibilidade de perícia prévia para garantir a viabilidade da empresa que pretende aderir à recuperação judicial e verificar a real condição de funcionamento da empresa devedora;
(iii) a possibilidade de tratamento diferenciado dos créditos de fornecedores que continuarem a prover o devedor após o pedido de recuperação;
(iv) ampliação de financiamento a empresas em recuperação judicial que poderá ser garantido com bens da empresa, como maquinários e prédios, por meio de alienação fiduciária ou mesmo na forma de garantia secundária;
(v) permite o parcelamento e o desconto para pagamento de dívidas tributárias, aumentando o número de prestações de 84 para 120 e diminuindo o valor de cada uma, podendo, ainda, quitar até 30% da dívida consolidada e dividir o restante em até 84 parcelas e, para pagar essa entrada, será possível usar 25% do prejuízo fiscal e 9%, 17% ou 25%, conforme o tipo de empresa, da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL);
(vi) prevê o uso de transação tributária, que são acordos para pagamento de dívidas mediante concessão de benefícios em que o governo ou o devedor propõe descontos para quitar a dívida, que podem chegar a 70% do valor devido, a ser paga em prazo máximo de 120 meses e, no caso de micro e pequenas empresas, o prazo pode chegar a 144 meses; (vii) na hipótese de o plano de recuperação judicial do devedor ser rejeitado, a assembleia poderá aprovar prazo de 30 dias para a apresentação, pelos credores, de um plano de recuperação da empresa;
(viii) autoriza que produtores rurais que atuem como pessoa física postulem recuperação judicial desde que o valor da causa não exceda a R$ 4,8 milhões;
(ix) cria regras para a insolvência transfronteiriça, disciplinando itens como o reconhecimento de processos estrangeiros, a colaboração entre juízes, a troca de informações, o tratamento dado no Brasil a credores estrangeiros, entre outros;
(x) ampliação da lista de possibilidades em que o juiz pode decretar a falência do devedor;
(xi) modifica o prazo para pagamento de crédito trabalhista por empresa em recuperação judicial de até 1 ano a contar da homologação do plano de recuperação judicial para até 2 anos, devendo ser aprovado pelos próprios credores trabalhistas na votação do plano.
A Lei condiciona a decretação da falência à rejeição do plano de recuperação dos credores, ou a sua não apresentação, ou se o devedor descumprir o parcelamento de dívidas tributárias prevista no projeto, ou se for identificado esvaziamento patrimonial da empresa que implique prejuízo dos credores.
Outro ponto que merece destaque é que a legislação atualmente em vigor regula o período de suspensão de ações contra a empresa em processo de recuperação judicial (stay period), marcando o início com o despacho da decisão judicial que recebe o pedido de recuperação e o término em 180 dias após essa data, com suspensão de ações e execuções no período, salvo as de natureza fiscal e as derivadas de contratos de leasing ou propriedade fiduciária e a alteração legislativa mantém essa regra, mas permite que o prazo de 180 dias seja prorrogado por 2 vezes, a primeira a critério do juiz e a segunda a critério dos credores.
O texto aprovado prestigia o uso da conciliação e da mediação no processo de recuperação e falência, com a criação de um mecanismo de suspensão de execuções contra o devedor, por 60 dias, a fim de incentivar a negociação com os credores. Esses mecanismos também serão admitidos em disputas entre sócios da empresa ou em conflitos envolvendo concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial e os órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais.
Ainda, houve a regulamentação de um ponto de discussão sobre a contagem dos prazos processuais após entrada em vigor do atual Código de Processo Civil, tendo sido definido que os prazos da Lei de Recuperação Judicial e Falência serão contados em dias corridos e não úteis. Já, quanto à impugnação das decisões proferidas no processo, serão recorríveis por meio de agravo de instrumento.
Vejamos o quadro comparativo a seguir:
Tema | Como era | Como ficou |
Dívidas tributáriasAmpliação das possibilidades de parcelamento de dívidas com a União para a empresa em recuperação judicial.
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– 84 prestações |
– 120 prestações e diminui o valor de cada uma. – possibilidade de quitar até 30% da dívida consolidada e dividir o restante em até 84 parcelas. – para pagar a entrada será possível usar 25% do prejuízo fiscal e 9%, 17% ou 25%, conforme o tipo de empresa, da base de cálculo negativa da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL).
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Plano de recuperação – possibilidade de que os credores apresentem um plano de recuperação da empresa, mesmo contra a vontade do devedor.
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– somente o devedor pode propor as condições de renegociação. | – na hipótese de o plano de recuperação judicial do devedor ser rejeitado, a assembleia poderá aprovar prazo de 30 dias para a apresentação, pelos credores, de um plano de recuperação da empresa que deverá cumprir as seguintes condições: apoio de credores que representem mais de 25% dos débitos ou de credores presentes na assembleia que representem mais de 35% dos créditos.
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Suspensão de ações
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– início com o despacho da decisão judicial que recebe o pedido de recuperação e o término em 180 dias após essa data, com suspensão de ações e execuções no período, salvo as de natureza fiscal e as derivadas de contratos de leasing ou propriedade fiduciária.
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– mantém a regra e possibilita que o prazo de 180 dias seja prorrogado por 2 vezes, a primeira a critério do juiz e a segunda a critério dos credores.
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Conciliação e mediação | – sem previsão específica |
– cria um mecanismo de suspensão de execuções contra o devedor, por 60 dias, a fim de incentivar a negociação com os credores. – admite conciliações e mediações em disputas entre sócios da empresa ou em conflitos envolvendo concessionárias ou permissionárias de serviços públicos em recuperação judicial e os órgãos reguladores ou entes públicos municipais, distritais, estaduais ou federais.
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Produtor rural
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– pedido de recuperação judicial apenas ao produtor rural pessoa jurídica que comprove pelo menos 2 anos de atividade.
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– possibilita que produtores rurais que atuam como pessoa física ingressem com recuperação judicial desde que o valor da causa não exceda a R$ 4,8 milhões.
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Insolvência transnacional
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– sem previsão
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– regula a falência e a recuperação judicial de empresa em negócios transnacionais, disciplinando itens como o reconhecimento de processos estrangeiros, a colaboração entre juízes, a troca de informações, o tratamento dado no Brasil a credores estrangeiros etc.
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Decretação de falência
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– hipóteses de decretação de falência: deliberação da assembleia geral de credores; não apresentação, pelo devedor, do plano de recuperação no prazo previsto; rejeição do plano de recuperação; e descumprimento de qualquer obrigação assumida no plano de recuperação.
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– também possibilita decretar falência em razão de descumprimento de pagamento em parcelamento de créditos tributários ou, se vendida a empresa em recuperação judicial, não sobrar recursos para honrar os créditos tributários e os créditos de credores não sujeitos ao plano.
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Créditos trabalhistas
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– proíbe a inclusão de créditos trabalhistas ou por acidente de trabalho na recuperação extrajudicial. – prevê o pagamento dos créditos trabalhistas em até um ano a contar da homologação do plano de recuperação judicial.
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– permite a inclusão de créditos trabalhistas ou por acidente de trabalho na recuperação extrajudicial, se houver negociação coletiva com o sindicato da respectiva categoria profissional. – a empresa terá até 2 anos para fazer o pagamento de créditos trabalhistas, se aprovado pelos próprios credores trabalhistas na votação do plano.
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Distribuição de lucros
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– insere na Lei de Falências a proibição de distribuição de lucros e dividendos durante o processo de recuperação judicial.
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Homologação de credores
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– a lei só permite o encerramento da recuperação judicial após a homologação do quadro geral de credores.
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– permite o encerramento da recuperação judicial antes da homologação do quadro geral de credores. – os credores que não forem reconhecidos antes do encerramento terão suas ações redistribuídas ao juízo da recuperação judicial como ações autônomas e observarão o rito comum.
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Deliberação virtual
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– trata da assembleia geral de credores como ato presencial.
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– qualquer deliberação da assembleia geral poderá ser substituída por termo de adesão firmado por credores de acordo com o quórum de aprovação específico, por votação em sistema eletrônico que reproduza as condições de tomada de voto da assembleia geral de credores ou por outro mecanismo considerado seguro pelo juiz.
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Impostos |
– possibilidade de parcelamento do imposto de renda e CSLL em caso de ganho de capital oriundo de venda de bens em recuperação ou falência. |
Citamos dois dos principais dispositivos vetados pelo Presidente da República que são: (i) a previsão de que o objeto de alienação na recuperação judicial estivesse livre de qualquer ônus e que não haveria sucessão do arrematante nas obrigações do devedor de qualquer natureza, e (ii) a suspensão, na hipótese de recuperação judicial, das execuções trabalhistas contra responsável subsidiário ou solidário, até a homologação do plano ou a convolação da recuperação judicial em falência.
A Lei 14.112/2020 entrará em vigor em 23 de janeiro de 2021.