Tributação de comércio e serviços digitais: panorama atual e perspectivas futuras
A dificuldade de compreender a tributação do comércio e a prestação de serviços realizados por meio de plataformas digitais pode levar empresas a gastarem mais do que precisam, ou menos do que devem, gerando graves consequências.
Muitas empresas já vinham adotando plataformas de e-commerce, bancos de dados digitais e outros recursos para prestação de serviços online há bastante tempo.
Além da diminuição de custos com atendimento e manutenção de espaços físicos, essas alternativas também se mostram benéficas pela capacidade de atingir mais pessoas pelo Brasil, e até pelo mundo, aumentando as receitas.
Com o advento da pandemia da COVID-19, o que era uma possibilidade de gastar menos e lucrar mais passou a ser praticamente uma obrigação.
Embora nem todos os negócios possam abrir mão dos serviços presenciais, migrando totalmente para ambientes virtuais, é fato que foi preciso, no mínimo, conciliar ambos.
No entanto, as tênues linhas que delimitam os espaços virtuais podem causar uma grande confusão do ponto de vista tributário.
Bitributação: a pedra no sapato das empresas de serviços digitais
Um dos casos que melhor ilustra essa confusão é a tributação do software no Brasil: alguns juristas acreditam que é ele tributável pelo Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS), por ser um serviço. Já outros acreditam que ele é uma mercadoria e que então deve incidir o Imposto sobre Operações relativas à Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços de Transporte Interestadual e Intermunicipal e de Comunicação (ICMS).
São impostos com finalidades e alíquotas diferentes, cobrados por entes difernetes – o ISS é Municipal e o ICMS é Estadual. Muitas vezes, o Fisco acaba cobrando ambos, e assim ocorre a bitributação: o contribuinte paga dois tributos oriundos de um só fato gerador.
A Associação Brasileira das Empresas de Tecnologia da Informação e Comunicação (Brasscom) foi ao Supremo Tribunal Federal (STF) lutar contra a incidência do ICMS na tributação de jogos digitais, downloads e serviços de streaming pelo ICMS, instituída pelo Convênio ICMS n.º 106, de 2017.
O processo não foi finalizado; está suspenso desde o início de novembro de 2020. Se a incostitucionalidade da incidência deste imposto declarada pelo STF, será uma das vitórias mais importantes para os donos e consumidores de negócios digitais de todos os tempos, porém poderá representar mais um fonte de receita dos Municípios, que estarão autorizados a pretender tributar pelo ISS
Esforços mundiais e nacionais na tributação de serviços digitais
Em 2013, a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico ou Económico (OCDE) até criou um projeto de estudos, o Base Erosion an Profit Shifting (BEPS), para desenvolver a forma ideal de tributação de operações e serviços digitais, a fim de evitar evasões fiscais. Cerca de 135 países, incluindo o Brasil, estão de alguma forma envolvidos no projeto.
Na Europa, países como França, Itália, Espanha, Polônia, Áustria, Hungria e o Reino Unido já implementaram sistemas de tributação de serviços digitais (digital service taxation, ou DST). Na América do Sul, países como Colômbia, Equador, Uruguai e Chile já têm leis a respeito.
No Brasil, as operações realizadas em plataformas digitais são tributadas como as demais, incidindo o Imposto sobre Serviços (municipal), PIS, COFINS, Imposto de Renda Pessoa Jurídica (IRPJ), e Contribuição Social sobre o Lucro Líquido.
Porém, existem diversos projetos que visam modificar a forma como essa tributação ocorre atualmente, instituindo:
- a Contribuição Social Especial sobre serviços digitais prestados por grandes empresas (Projetos de Lei Complementar n.º 218 e n.º 241, ambos de 2020);
- a Contribuição de Intervenção sobre Domínio Econômico sobre receita bruta de serviços digitais, ou “CIDE-Digital” (Projeto de Lei n.º 2358/2020);
- o Imposto sobre o Valor Adicionado (IVA), imposto que deve concentrar todas as cobranças incidentes no ciclo de consumo, substituindo então o PIS, COFINS, IPI, ICMS e ISS (Propostas de Emenda Constitucional n.º 45 e 110, de 2019).
A instituição do IVA faz parte do projeto da Reforma Tributária e tem sido apontado como uma boa solução para evitar a confusão ou bitributação do comércio e serviços em plataformas digitais, inclusive os serviços de plataformas como Netflix e Spotify
Porém, também há quem acredite que o IVA irá encarecer esses serviços para os provedores, e consequentemente, para os consumidores também.
Assim, às empresas de comércio e serviços em plataformas digitais, recomenda-se que estejam devidamente assessoradas por advogados especializados.
É preciso acompanhar as alterações legislativas na área, inclusive elaborando consultas tributárias à Receita, se for preciso.
Também é recomendável esenvolver um planejamento tributário adequado para evitar riscos de penalidades pelas autoridades fiscais, criminais, e para obter o máximo de economia tributária.